Cerco à
memória | 2008
O fim de uma viagem é apenas o começo doutra.
José
Saramago
Afinado com as palavras de Saramago,
Alexandre Sequeira segue sempre em viagem sem medir distâncias, o prazer do
caminho está na cidade por conhecer, no retorno ao lugar, nas relações afetivas
que estabelece com as pessoas. Cenas, imagens e histórias vão constituindo-se e
sendo compartilhadas; foi o caso de Mocajuba, Lapinha da Serra. A força do encontro
situa-se no fio da memória, nas experiências vividas, no prolongamento do terno
abraço que reafirma a estima ao corpo do outro. Em 2008, sucessivas viagens o
conduziram às comunidades quilombolas, aos assentamentos de pequenos
agricultores. Desta vez a intranquilidade rondava o ambiente, o colocava em
meio às tensões, às ameaças, muitas vezes silenciosas. Memória e relatos
trouxeram de volta as ações noturnas de apagamento, a cortante crueldade de
eliminar as lembranças, retirar os vestígios dos mortos, dos antepassados, da
simbólica resistência que pairava sob a terra. O artista não deixa passar
impune o que escuta e vê, com sua imagem, nos coloca no centro do fogo, nos
insere na situação de risco, nos faz pensar sobre os cemitérios que foram e são incendiados na ilusão de
exterminar laços de parentesco, de afeto.
O cerco à memória deixa as marcas do túmulo
violado, mas não consegue retirar a trágica cicatriz que permanece no corpo
vivo que narra a sua história.
Marisa Mokarzel
* Texto escrito para a Sala Especial do Arte Pará 2013.